Prólogo
Eu adoro discos de vinil. Eu não compro CDs, e raramente baixo alguma música. Normalmente, eu vou à loja de discos e compro alguns vinis usados. Também sou um grande fã de música eletrônica. Se você me pedir para dizer os nomes de vinte músicas do Kraftwerk, pode ter certeza que eu conseguirei!
Procurei a respeito desse disco na internet, e encontrei algumas informações em um site extremamente tosco sobre gravadoras independentes. Descobri que esse álbum era na verdade um single 7”, e para todos vocês que são jovens demais pra entender o que isso significa, um single 7” é um disco de menor tamanho e que tem apenas uma música em cada lado do vinil. Depois de ler mais algumas informações que haviam ali, descobri que esse álbum tinha apenas uma música, mas dividida em duas partes. O nome da música era “Eletric Chair” (Cadeira Elétrica). Não sei de onde eles tiraram o título “Record Grooves”.
Pesquisei um pouco mais, e fiquei chocado ao descobrir que se trata de um single extremamente raro! Apenas 25 exemplares foram produzidos devido a problemas financeiros (algo extremamente comum nos anos 70). Ao menos, era isso que constava no site.
Resumidamente: eu tinha que conseguir esse disco a todo custo!
Comprando o disco
Eu fui naquela loja de discos que mencionei anteriormente. Era uma lojinha de esquina, com uma porta vermelha e letreiro, mas seu interior era o sonho de qualquer colecionador de discos. Haviam discos por todos os lados, alguns em excelente estado de conservação. “Se há algum lugar onde eu posso encontrar esse disco”, pensei, “é aqui”. Entrei e fui falar diretamente com Mark, o dono da loja. Como ele também é um perito em discos de vinil, achei que ele podia saber algo a respeito desse álbum.
Eu estava errado.
Ele pareceu intrigado quando lhe perguntei a respeito. Ele disse que nunca tinha ouvido falar a respeito do disco, muito menos da banda. Isso me decepcionou, mas decidi dar uma olhada na loja mesmo assim. Depois de procurar um pouco, eu o encontrei! Eu mal podia acreditar. Não era nada surpreendente ver que a capa não estava em ótimas condições. Havia uma camada de poeira nela, e parte do papel em que a capa estava impressa havia descascado.
Foi aí que notei algo estranho. A imagem da capa era diferente: aquela que eu tinha visto na internet mostrava uma capa preta, com lábios ao centro. Essa, por outro lado, trazia um olho arregalado, e aparentemente uma lágrima caindo dele. Mas isso não me incomodou muito. Muitos artistas tinham feito diferentes capas para um mesmo álbum, também. Mas... Teriam os membros da banda feito uma capa diferente pra cada um dos 25 álbuns? Isso teria custado mais caro que fazer várias capas idênticas. Outro detalhe estranho: o disco estava perfeitamente conservado. Não havia um cisco de poeira, nem mesmo um arranhão. Recoloquei o disco dentro da capa interna e voltei para o caixa. Coloquei o disco em cima do balcão, e Mark olhou para mim de um jeito esquisito.
“É estranho”, ele disse. “Não lembro de ter visto esse disco entrar aqui”
“Quanto é?” perguntei educadamente, apesar de minha pressa.
“Sabe de uma coisa? Pode levá-lo de graça. Não vejo nenhuma etiqueta de preço, e não lembro de ter obtido esse disco, então é todo seu”, ele disse, ainda mantendo aquela expressão intrigada.
Aquilo me surpreendeu, mas fiquei bastante feliz. Não tinha muito dinheiro naquele dia, e não queria correr o risco de que alguém comprasse o disco antes de mim. Agradeci a Mark e voltei apressadamente para casa.
Cheguei rapidamente em casa. Corri para meu quarto, tirei o disco de dentro da capa, coloquei-o com cuidado no prato, liguei meu toca-discos, posicionei a agulha na primeira ranhura do vinil, e o disco começou a tocar.
A introdução era fantástica. Parecia muito com uma música do Kraftwerk, mas com sintetizadores um pouco mais intensos. Era muito cativante, e os vocais eram incríveis!
Foi aí que as coisas começaram a ficar estranhas.
De repente, os vocais ficaram mais e mais eletrônicos, até o ponto em que você mal podia entender o que ele estava cantando. Além disso, a música parecia fora do tom. Ficou quase insuportável de ouvir, eram apenas rimas infantis acompanhadas por uma música incrivelmente alta. Finalmente, e é aí que tudo fica mais estranho, o vocalista pede para que uma garota, que está no mesmo local que ele, cante. Há uma pausa. A música continua tocando ao fundo por um minuto, e então ouve-se o microfone sendo movido.
Então eu pude ouvir uma garota chorando. Junior, o vocalista, então, gritou “CANTE! CANTE!” mas ela apenas continuou chorando, e cada vez que ele gritava, ela chorava e gritava mais alto ainda. De repente, ela gritou com todo seu fôlego “ALGUÉM ME AJUDE, POR FAVOR!!” A música continuava tocando ao fundo, enquanto Junior ria para si mesmo. Eu comecei a me preocupar, não parecia que ela estava atuando, ela realmente gritava por ajuda.
Nervoso, eu continuei escutando. Enquanto Junior ria sozinho, você podia ouvi-lo apertar botões e girar chaves que, num primeiro momento, achei que eram dos sintetizadores. Mas após um grande estalido, veio um zumbido acompanhado pelo som de algo crepitando, e então a garota gritou ainda mais alto.
Foi então que eu entendi.
Agarrei a capa, que estava em cima da mesa. Virei-a e olhei a parte de trás. O nome da música era “Eletric Chair”. Derrubei a capa, em pânico, quando finalmente entendi que aquele zumbido não era nenhum sintetizador. Levantei a agulha, tirei o disco do prato, coloquei-o dentro da capa e guardei tudo dentro de meu cofre.
Eu não consegui dormir direito naquela noite, eu havia escutado mais do que gostaria naquele disco. Os gritos selvagens da garota e a risada sutil de Junior eram assustadores. Conforme meus olhos se acostumaram com a escuridão do quarto, eu encarei meu cofre, mas não me mantive acordado por muito tempo. Acabei caindo no sono. Mais ou menos às 4:30 da manhã, acordei de repente. Um som alto, grosso e eletrificado encheu o ambiente. Levantei de um salto e procurei pela fonte daquele som. Vinha do meu toca-discos. Para meu horror, lá estava o disco.
Estava tocando o lado B.
Novamente, ouvi aqueles zumbidos, e a risada de Karl Junior, enquanto uma música eletrônica extremamente hipnótica tocava ao fundo.
Corri para o toca-discos, tirei o disco do prato novamente e liguei a luz. Fiquei chocado ao ver que haviam marcas no disco, que formavam as palavras “Veja, Cheire”, e com letras pequenas no lado A do disco, “Eletrizante”. Parecia que alguém escavou as letras no disco usando um prego quente.
Não podia mais suportar isso. Joguei o disco e a capa pela janela, e assim que pude, fui para os fundos de casa e destruí tudo.
Um senhor que morava ao lado de nossa casa veio me perguntar o que havia sido todo aquele barulho da noite anterior. Eu disse que não sabia, e que certamente não era nada para se preocupar. Não conseguiria imaginar uma maneira de dizer a ele o que havia acontecido.
Fiquei extremamente calmo nesse dia. Enquanto ouvia alguns discos de blues, eu ocasionalmente olhava pela janela e via os pedaços de vinil espalhados pelo jardim. Tentei ignorar, mas era impossível. Desci apressadamente, peguei uma pá e fui para o jardim. Tentei pegar os restos do disco, mas estavam incrivelmente quentes! Tive que usar uma toalha para recolher tudo aquilo. Cavei um pequeno buraco e joguei tudo lá dentro, os restos do disco e também a capa. Joguei um pouco de vodca, e após olhar por uma última vez, ateei fogo naquela porcaria.
Depois que as chamas se apagaram, cobri o buraco. Nada mais havia ali a não ser cinzas e plástico queimado.
Fiquei bastante feliz ao perceber que não veria mais aquela merda.
Sete anos depois
Ainda consigo me lembrar de todos os horrores envolvendo esse disco, mas nunca me preocupei muito, já que nada aconteceu depois de tudo isso.
Mas eu notei algo estranho, algo que eu nunca havia notado antes.
Um odor forte, como o de uma carne que foi esquecida no fogão e acabou queimando. Foi aí que eu me lembrei, e entrei em pânico. No disco, “Veja” e “Cheire” estavam esculpidos por cima das ranhuras. Ainda assim, eu tinha minhas dúvidas quanto a isso ter qualquer coisa a ver com aquele odor. Eu decidi procurar pela fonte de origem dele. Vinha do meu porão. Notei que vinha exatamente de uma rachadura em uma das paredes.
Por algum estranho motivo, aquela era a única rachadura na parede, e eu nunca havia notado. Nervoso, me aproximei dela.
O que quer que fosse aquele odor, vinha de dentro da parede.
Com cuidado, toquei-a, e estava incrivelmente quente. Mas apenas naquele ponto: todo o resto da parede estava frio pra cacete, uma vez que estávamos no meio do inverno.
De repente, parte da parede ruiu. Poeira e pedaços de parede caíram no chão, e eu corri de volta para as escadas para não ser atingido. Estava em choque, mas também estava furioso por minha parede ter caído. Peguei uma pá, e comecei a recolher toda aquela sujeira, jogando-a num balde.
Meu coração parou. Senti vontade de vomitar.
Eu vi o corpo carbonizado de uma garota, seu rosto totalmente negro com marcas de queimaduras, com fumaça saindo de seus cabelos, e seus dentes, trincados, com uma coloração de marrom escuro. Sua pele estava com uma textura quebradiça, e pedaços dessa pele morta e queimada estavam espalhados pelo chão de meu porão, misturados a toda aquela sujeira.
Vi sangue saindo de seus olhos, e o odor de carne queimada encheu todo o porão, até o ponto em que quase vomitei. Caí no chão, e rastejei para fora em pânico. Tentei deixar escapar um grito ou mesmo um choro, mas estava petrificado de medo.
Fiquei parado por quase meia hora, em silêncio. Minha respiração estava pesada, eu não piscava e tremia muito. Não olhei para o corpo por um bom tempo, mas finalmente tive a coragem de ir até lá e dar uma olhada.
Em suas mãos ela segurava uma cópia do álbum “Record Grooves”.
Ninguém deve passar pelo que eu passei.
Fonte: creepypastabrazil.blogspot.com
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